Depois da minha breve experiência de um ano e meio morando na Amazônia retorno ao sudeste com um misto de sentimentos. Por um lado, um apego e uma saudade antecipada dessa floresta abundante, do Pará, desse povo amável, dessas mulheres fortes, do açaí, do carimbó, dessa beleza e energia únicas.
Por outro, uma imensa satisfação por voltar a ter acesso fácil a consultas médicas com agendamentos razoáveis, serviços com qualidade aceitável, transporte com horários adequados, entre outros “luxos” que a gente tem no Sudeste e, em maior ou menor grau, em todas as outras regiões do país.
O fato é que o Norte do país é uma região esquecida. Quase metade dos paraenses viveu abaixo da linha da pobreza em 2017, sendo 46% da população com renda inferior a estabelecida pelo Banco Mundial (US$ 5,5 PPC por dia). Estes paraenses ganham menos de R$406 por mês. O estado possui o terceiro pior percentual da região Norte, ficando atrás apenas do Acre e Amazonas. Os dados são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Falando em saneamento básico, o Pará também tem um dos piores índices do Brasil. É inacreditável ver e aceitar o esgoto sendo despejado a céu aberto no meio das cidades e nos rios. Apenas 1,18% de tratamento de esgoto, 4,92% de coleta de esgoto, 47,10% de rede de água e a perda de água é de inacreditáveis 39,72%, de acordo com o Instituto Trata Brasil, uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip).
Ampliando a visão dos números para toda Região Norte, os dados não ficam melhores em proporção. A restrição a serviços de saneamento básico atinge 82,3% das pessoas. A participação junto ao Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil é de apenas 5%, sendo a menor contribuição em se tratando das demais regiões. Outros problemas sociais são também o analfabetismo (atingindo 10% da população) e mortalidade infantil (23,5 a cada mil nascidos vivos), também segundo o IBGE.
E não bastasse ser uma terra abandonada pelas políticas públicas, por ser rica em minérios e outros insumos preciosos ela é cobiçada por muitos. Como cantou Zeca Baleiro: “malandro que é malandro não teme a morte, malandro que é malandro vai pro Norte, enquanto os patos vão pro Sul”. Esse trecho ilustra um pouco como, apesar de ter muita gente boa (e às vezes um pouco inocente), o Norte também tem muitas pessoas que se aproveitam dessa bondade – os “espertos” (às vezes bem perigosos).
O desmatamento (zero???) tem aumentado. Se nos tirarem acesso as informações de qualidade (com as do Inpe), como tem sido sugerido, essa realidade vai permanecer ou piorar ainda mais.
Saio da Amazônia, mas ela não sai de mim. Saio com a certeza de que não é um adeus, mas um até logo. Me sinto mais conectada do que nunca com a floresta, sua gente, suas necessidades, seu grito por visibilidade e respeito e sua complexidade.