Skip to main content

Matéria do Valor Econômico: Redes varejistas ligam o artesão ao consumidor final

Por 25 de setembro de 2013setembro 28th, 2016Artigos

O jornal Valor Econômico publicou nesta semana uma matéria muito legal sobre o trabalho desenvolvido pela Raízes no Vale do Jequitinhonha (MG).

 

Confira o texto completo de Andrea Vialli. A gente recomenda!

 

O caminho percorrido entre a peça de cestaria produzida pelas mulheres do Vale do Jequitinhonha, no Estado de Minas Gerais, ou do mel das abelhas do Xingu, no Norte do Estado do Mato Grosso, até o consumidor final nem sempre é suave.

 

De um lado, estão as comunidades que produzem itens típicos da cultura regional, ávidas para ver seus produtores distribuídos em todo o país, mas muitas vezes sem estrutura e conhecimento em gestão para acessar esses mercados. Do outro lado, redes do varejo atentas ao potencial de vendas desses produtos, mas que enfrentam o desafio da falta de escala e logística para trabalhar com esses fornecedores.

 

Para aproximar os consumidores dos artesãos, redes do varejo começaram a investir, desde a última década, em programas de desenvolvimento de fornecedores com essas características. O Grupo Pão de Açúcar, por exemplo, criou há 11 anos o programa Caras do Brasil, com o objetivo de oferecer um canal de vendas, nas lojas da sua rede de supermercados, para produtos oriundos de iniciativas de manejo sustentável, de cooperativas de artesãos e também de pequenos produtores de alimentos.

 

“Buscamos valorizar a identidade cultural de cada região do país oferecendo esse canal de comercialização nas gôndolas”, explica Patricia Santana, assistente social por formação e hoje coordenadora do programa Caras do Brasil. Cerâmica, objetos de decoração, cestarias, redes e produtos alimentícios, como mel e geleias, fazem parte do leque de produtos que podem ser encontrados em 99 das 150 lojas mantidas pela rede do Pão de Açúcar.

 

Calcula-se que em torno de 60 fornecedores fazem parte desse programa. Patricia Santana percorre o país para participar de eventos e feiras de negócios com o objetivo de encontrar novos fornecedores que integrem o perfil do Caras do Brasil. Em muitos casos, as jornadas são longas e envolvem horas de deslocamento de barco no meio da selva amazônica – caso do mel produzido pelos índios do Xingu.

 

Com a Cerâmica Serra da Capivara, no Estado do Piauí, o programa estabeleceu uma parceria que já dura seis anos e envolve também o desenvolvimento de novos produtos. Atualmente as lojas do Pão de Açúcar comercializam seis diferentes peças desenvolvidas pelos produtores da Serra da Capivara, e compram 40% da produção mensal da Cerâmica. Em contrapartida, os artesãos da cerâmica estão envolvidos no processo de criação de novas peças, como uma caneca com design exclusivo.

 

“A entrada da cerâmica no programa Caras do Brasil possibilitou um fluxo de caixa mais contínuo, tendo em vista que os pedidos são constantes. Isso ajudou a dar maior estabilidade financeira ao nosso negócio”, explica Girleide Oliveira, administradora da Cerâmica Serra da Capivara. As peças que trazem a pintura rupestre dos paredões rochosos do Piauí como inspiração estão entre os itens mais vendidos do programa Caras do Brasil.

 

Também compradora de peças da Cerâmica Serra da Capivara há dez anos, a varejista de móveis e decoração Tok&Stok comercializa as peças com inspiração rupestre, mas com a diferença de apresentar um design próprio – as peças como pratos e tigelas são assinadas pela designer brasiliense Cristiane Dias.

 

A rede de lojas mantém há duas décadas um setor dedicado às compras de artesanato regional brasileiro, que inclui 80 fornecedores. A maior parte deles vem está nas regiões Norte e Nordeste do país. “Percebemos que, com a globalização, o consumidor está valorizando os produtos artesanais produzidos no Brasil. Ele busca essa diferenciação, e não quer mais a peça feita na China, que pode ser encontrada em qualquer lugar”, diz Ademir Bueno, gerente de design e tendências da Tok&Stok.

 

A principal dificuldade, diz Bueno, ainda é encontrar fornecedores que tenham condições de realizar a logística dos produtos – uma das maiores dificuldades é que os fornecedores produzam e entreguem as mercadorias no centro de distribuição da empresa, em São Paulo, dentro do prazo combinado. Outro requisito para os fornecedores de artesanato é que observem padrões de embalagem e etiquetagem dos produtos, diz Bueno.

 

Além dos grandes varejistas, existem iniciativas que se dedicam a fortalecer as comunidades artesãs para que possam encontrar condições de comercializar seus produtos nos grandes mercados consumidores. A Raízes Desenvolvimento Sustentável, empresa criada pelas turismólogas mineiras Marianne Costa e Mariana Madureira, começou em 2009 como um e-commerce de artesanato típico do Vale do Jequitinhonha, considerada a região mais pobre de Minas Gerais.

 

No início, o trabalho envolvia 20 comunidades produtoras de artesanato da região, a maioria formada por mulheres. Mas as dificuldades de encontrar empresas dispostas a pagar o preço justo pelo artesanato local obrigou as sócias a mudar a estratégia de negócios. “Recebíamos pedidos de orçamento para brindes corporativos, mas no final as empresas optavam por outro tipo de produto e as artesãs do Jequitinhonha ficavam frustradas com isso”, conta Marianne Costa. A empresa continua apoiando as artesãs, mas o projeto evoluiu e hoje envolve o turismo de base comunitária – comercializa viagens à região, onde os visitantes podem conviver com as artesãs, se hospedar na casa delas e, por fim, comprar o artesanato produzido lá. “Essa estratégia tem possibilitado um impacto maior nas comunidades”, diz Costa.

 

A Artesol, rede de apoio a comunidades artesãs criada pela ex-primeira dama Ruth Cardoso, também aposta no caminho de revitalização e geração de renda por meio do artesanato tradicional. O trabalho da organização consiste em mapear regiões que possuam um artesanato local típico e as principais fragilidades dessa cadeia, além de capacitar grupos e cooperativas e promover uma articulação para encontrar canais que valorizem o trabalho das comunidades. “O trabalho começou com 26 grupos, e nos últimos 15 anos conseguimos trabalhar com mais de 100 iniciativas em todo o Brasil”, diz Josiane Masson, coordenadora executiva da Artesol. (AV)

 

Fonte: Valor Econômico