O mundo inteiro estava com os olhos voltados para a COP 28 nos últimos dias. Trata-se da 28ª edição da Conferência das Partes, da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC). Neste ano, o grande encontro aconteceu de 30 de novembro a 12 de dezembro em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
A maior delegação do evento foi de pessoas brasileiras, com mais de 3 mil participantes. Uma coletividade cheia de representatividade, entre elas Anna Ferreira, Consultora de Sustentabilidade da Raízes, que atuou como uma das intérpretes da conferência.
O evento faz parte de uma série de reuniões anuais nas quais os países membros discutem e negociam ações globais para lidar com as mudanças climáticas.
A COP é o órgão supremo de tomada de decisões da UNFCCC e reúne representantes de governos, organizações não governamentais (ONGs), agências da Organização das Nações Unidas (ONU), e outros interessados. O evento faz parte de uma série de reuniões anuais nas quais os países membros discutem e negociam ações globais para lidar com as mudanças climáticas. A UNFCCC foi adotada durante a Cúpula da Terra no Rio de Janeiro, em 1992, e entrou em vigor em 1994.
O principal objetivo é avaliar o progresso nas ações contra as mudanças climáticas e negociar acordos adicionais para fortalecer a resposta global ao problema.
Cada um dos 12 dias da conferência foi dedicado à discussão de um tema específico, entre eles: saúde, recuperação, paz, finanças, comércio, igualdade de gênero e responsabilidade, energia e indústria, transições, povos indígenas, ação multinível, trânsito, urbanização, jovens, crianças, educação, competências, natureza, uso do solo e oceanos.
Anna – que aqui na Raízes teve funções com foco na parte internacional, auxiliando na tradução do site novo, vídeos, newsletter internacional, redação de propostas em inglês e espanhol e nos comitês de Meio Ambiente, Sustentabilidade e Recertificação B Corp – nos contou um pouco de como foi a experiência incrível de fazer parte da delegação do Brasil. Confira a entrevista a seguir:
Raízes DS: Como está sendo a experiência de participar da COP28?
Anna Ferreira: Maravilhosa e uma grande abertura de olhos acerca do que está sendo feito e do que ainda há por fazer. Confesso que tive algumas experiências que me mostraram que muitas coisas não são como imaginamos… Nas mesas onde as maiores decisões são tomadas, ainda vemos muitos homens brancos europeus, mas sem dúvida há movimento e maior articulação com minorias e povos originários.
Qual foi sua palestra favorita até agora na COP 28?
Muitas! A plenária na qual o presidente Lula chamou a ministra Marina Silva no palco principal, que tive a oportunidade de assistir com a assessoria (feminina) da ministra que conheci no Pavilhão do Brasil nos emocionou. Também interpretei um painel do Pavilhão de Mulheres e Constituição de Gênero (WCG) sobre Lideranças Femininas Indígenas Brasileiras da Anmiga, e este também foi bastante impactante e poderoso.
Na COP 27 vimos que o Brasil voltou a ser protagonista na Agenda Global de Clima, como você vê a participação do Brasil na COP 28?
AF: Somos oficialmente a maior delegação presente, com mais de 3 mil participantes. Há estudantes, lideranças indígenas, povos originários, representantes quilombolas, comunidades ribeirinhas, jovens, e também tivemos a participação do Ministro de Finanças, aparentemente pela primeira vez. Há muita participação e atenção dada aos países amazonenses. E pessoas com quem falei das delegações francesa, inglesa, americana e de outros órgãos mesmo dentro da ONU, todos têm uma excelente impressão do atual governo.
Um delegado francês me disse que os europeus ainda pensavam que salvar o Planeta perpassava apenas salvar árvores, e que o Presidente Lula e seu governo, através do Ministério de Povos Indígenas, por exemplo (a Ministra Sonia Guajajara foi nomeada como Chefe da Delegação Brasileira da COP 28) mostraram que, na verdade, isso também perpassa, acima de tudo, salvar pessoas. Ele, por exemplo, nem sabia que existiam pessoas vivendo na floresta, e se desculpou por sua ignorância. Disse também que o lugar de fala do presidente ajuda, e que é muito mais fácil que os países do sul global (termo utilizado em estudos pós-coloniais e transnacionais que pode referir-se tanto ao terceiro mundo como ao conjunto de países em desenvolvimento) conversem entre si e se entendam, sem que isso seja sempre feito por homens brancos ocidentais (os maiores responsáveis pela atual situação).
Através do seu olhar, como Consultora de Sustentabilidade aqui da Raízes DS, quais esforços nós precisamos fazer, como sociedade, para cumprir a agenda do clima?
AF: Mais representatividade, sem dúvida.
Acho que dar o protagonismo a todos aqueles que realmente podem dar as soluções, escutar, dar os recursos necessários e cobrar que grandes empresas poluidoras e setores sejam responsabilizados e/ou paguem por seu papel na situação em que nos encontramos.
Reitero, os povos indígenas devem estar nas mesas em que grandes decisões são tomadas. Deve haver muito mais representatividade do sul global, e tudo que eles pedirem, devemos fazer. O urbanismo, modernidade e capitalismo criaram o problema, e a minha observação é de que até mesmo nós, brasileiros, conhecemos muito pouco da Amazônia, das lideranças, projetos, povos, o que fazem, o que necessitam, e imagino que se é o caso, o europeu, americano e afins, saberão ainda menos.
Como a participação na COP 28 agregou na sua vida profissional e pessoal?
AF: Muitíssimo! Notei que a ONU é uma organização muito mais branca, elitista, americanizada e política do que pensava – o que foi decepcionante, não posso negar. Pelo que pude presenciar, ainda há muito a percepção colonizadora de que todos devem falar inglês, há falta de sensibilidade e até mesmo recursos, criando situações desnecessárias e embaraçosas para as lideranças latino-americanas. Houve sem dúvida algum movimento nesse sentido, mas ainda não é o suficiente.
Foi lindo ver a representatividade em toda parte ao caminharmos pela COP 28, mas pouquíssimas dessas pessoas estavam nas plenárias, as quais são primordialmente brancas e masculinas, e onde as decisões são tomadas.
Aprendi bastante acerca das lutas dos povos, e vários deles mencionaram que precisam ser mais ativamente consultados, não apenas usados para fotos falando em mudança climática. Um esforço coletivo organizado deve ser feito, escutando aqueles que estão mais conectados com a Terra, sabem lidar com ela, dando-lhe tudo o que necessitam. Ao mesmo tempo, é complicado pensar que, por exemplo, tanto esta COP 28 em Dubai quanto a do próximo ano, COP 29, no Azerbaijão, serão feitas em países petrolíferos, com PIBs e economias altamente dependentes dos combustíveis fósseis.
Entendo que o Governo brasileiro, as ministras Marina e Sônia, e o Ministro Haddad, estão lançando planos para pedir financiamentos a países ricos, fundos soberanos, etc. o que infelizmente, na situação em que nos encontramos, é necessário, mas é triste de certa forma. Sou uma pessoa positiva, sei que nos adaptaremos e somos resilientes, mas é uma pena que tenhamos chegado até aqui. Que as coisas estejam melhores na nossa COP 30, em 2025, na Amazônia! Seguimos!
Segundo a The Natural Conservancy (TNC), a meta global para limitar o aumento da temperatura média do planeta e reduzir os efeitos nocivos das mudanças climáticas é de 1.5°C. Proteger e restaurar a natureza pode proporcionar ⅓ de reduções de emissões de CO2. Menos de 10% é o montante do financiamento climático atualmente atribuído a soluções baseadas na natureza.
Precisamos de ações radicais que beneficiem o clima – e precisamos delas agora. A COP é a oportunidade para o mundo entrar em acordo e aumentar a sua ambição pela justiça climática. Leia outros conteúdos nossos sobre o tema aqui.
