Começo o título desse texto sobre economia regenerativa com uma frase de um poeta e filósofo nigeriano, Bayo Akolomafe. Autointitulado como pós-ativista, suas ideias são provocações para repensarmos nossa atual relação com tudo que existe.
Você já deve ter ouvido alguma dessas histórias de desequilíbrio ecológico causado pela inserção de uma espécie exótica em um ecossistema, certo? O caramujo-gigante-africano e o mexilhão-dourado são exemplos de espécies introduzidas no Brasil com alto impacto negativo para o meio ambiente. Mas é interessante notar que passado um tempo (às vezes muito tempo), as condições ambientais se adequam, formando um novo equilíbrio. Recentemente a The Nature Conservancy (TNC) fez a retirada de ratos do Atol de Palmyra no Pacífico. Eles haviam sido introduzidos há décadas atrás e a crescente população preocupava os conservacionistas. Contudo a retirada aumentou a quantidade de coqueiros (que eram seu principal alimento), o que piorou a qualidade do solo e afastou aves migratórias, gerando grandes mudanças.
O equilíbrio se estabelece no movimento
Bom, contei essa história toda para reforçar pontos que podem parecer óbvios, mas dos quais a gente se esquece: tudo muda e o equilíbrio se estabelece no movimento.
Uma outra forma de elucidar essa afirmação é usarmos como exemplo uma pose de yoga. Experimente colocar a planta de um dos pés na parte interna da coxa e levantar os braços com as mãos unidas. Conhecida como Vrksasana, ou simplesmente postura da árvore, essa pose só pode ser mantida se o praticante tiver a habilidade de driblar o desequilíbrio ajustando a quantidade de peso alocada sobre as laterais, parte frontal dos pés ou os calcanhares. Os braços, e mesmo o tronco, podem entrar em pequenos (ou nem tão pequenos) movimentos para restabelecimento do equilíbrio – que, dessa forma, nunca é totalmente estático.
Os movimentos podem ser imperceptíveis por serem muito pequenos (os músculos dos pés) ou de longo prazo (a adaptação do ecossistema aos ratos em décadas), mas são uma constância em tudo que nos rodeia.
Em ambientes complexos, isto é, com grandes cadeias de interdependência, e sistêmicos, o que significa que existe causalidade e retroalimentação dessas cadeias, torna-se desafiador prever os resultados de intervenções. Podemos executar um projeto ecológico bem-intencionado que acabe por expulsar as aves migratórias que queríamos proteger. Ou com menos repercussão, mas ainda de forma dolorosa, dar com a cara no chão quando só queríamos nos alongar e acalmar a mente.
Como lidar com problemas sistêmicos em ambientes complexos?
A economia regenerativa nasce com uma proposta de, humildemente, aprendermos com a natureza sobre equilíbrio – incluindo seus tempos e seus micro movimentos. Sem a pretensão de defini-la nesse curto compartilhamento de reflexões, posso dizer que economia regenerativa é mais sobre não saber (e por isso observar) do que responder. Como o antropólogo britânico Tim Ingold apontou como fraqueza, “com todos os dados nas pontas dos dedos, achamos que já sabemos de tudo que há para saber; no entanto, sabendo tudo, deixamos de ver ou aprender com o próprio mundo”.
A economia, nos lembremos, não é sobre dinheiro, mas sobre a administração dos recursos. E a regeneração é sobre gerar novos fluxos de vida. O que precisamos podar e o que precisamos deixar brotar? Me lembro sempre do mestre Humberto Maturana, neurobiólogo chileno: “a vida se transforma com base no que eu decido conservar”.
Porém, mais do que uma decisão única, mais do que respostas definitivas, o convite é para que possamos atuar de forma mais experimental, intencional e atenta. Mais do que ir depressa em uma direção incerta, testar passos curtos e observar a reação do ecossistema. Assim, podemos decidir manter uma parte dos roedores no atol ou apoiar um pé no chão antes que a gente – ou nosso ambiente – se machuque.